Extraordinário o relacionamento íntimo que tenho com livros e as histórias neles contidas.
Que magia percebo emanar destes objetos.
Que poder exercem sobre mim.
Com que encantamento me pego a olhar, tocar, preparando-me para o ato de desvendar o que pode estar por trás de sua capa, lombada.
É sempre uma experiência similar ao enamoramento.
Acabo de ganhar Walt Whitman, Folhas de Relva, uma edição de capa suave ao toque, bela, que menciona nos créditos, poeticamente, ter sido o livro "impresso na primavera de 2006."
Sinto uma estranha sensação, a de que devo lhe pedir desculpas por ter que fazê-lo esperar um pouco. Ainda não terminei de reler Caminho da Liberdade, de Howard Fast. Porque sei que me esperam emoções muito fortes, de grande tristeza, indignação e revolta, nas últimas páginas deste relato dos anos seguintes à Guerra de Secessão americana, suas conseqüências na vida dos escravos libertos, a organização e fortalecimento da Klu Klux Klan, o conseqüente desmoronamento de um sonho que aqueles homens, mulheres e crianças estiveram vivendo, finalmente adquirindo direitos humanos, tais como os de estudar, comprar terras, comercializar o produto de seu trabalho livre, em igualdade de condições com os brancos. Haviam conseguido também o direito de ter representantes na Convenção onde leis iriam ser criadas ou modificadas para que fosse possível a reconstrução dos estados sulistas após a Secessão. Assim Gideon Jackson foi escolhido para ser representante dos negros e teve que viajar para a Carolina do Sul. Tudo envolvido em uma aura de sonho, mistério.
Sonho brutalmente interrompido por aqueles que acharam o bolo muito pequeno para ser dividido.
Estas últimas páginas me emocionaram muito a cada vez que reli este livro.
Talvez eu esteja ainda mais sensível (coisas da idade), mas percebo que, desta vez, sentirei mais profundamente o sofrimento que lerei nas palavras que descrevem a luta daquela comunidade ao perder, um a um, seus membros e entes queridos, alguns ignorando o motivo de tamanho ódio, surpresos com quanta brutalidade pode ser capaz um único ser humano, atônitos com a hipocrisia de uma sociedade dita cristã, que fechou os mesmos olhos que, ao entrar numa igreja, dirigem à imagem do Cristo ao fazer o sinal da cruz.
Assim vou adiando o momento de retomar a leitura, espantada comigo mesma, afinal, posso simplesmente desistir do livro, posso me convencer de que não passa de ficção, posso colocá-lo por baixo na pilha-dos-que-esperam-sua-vez-de-serem-lidos, posso primeiro ler Walt Whitman, já que o queria tanto e acabo de ganhá-lo...
Mas não. Vou cumprir minha sina!
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