Um livro que se auto-apresenta ao leitor assim:
Estás para começar a ler o novo romance Se um viajante numa noite de inverno, de Italo Calvino. Descontrai-te. Recolhe-te. Afasta de ti todos os outros pensamentos. Deixa esfumar-se no indistinto o mundo que te rodeia. A porta é melhor fechá-la; lá dentro a televisão está sempre acesa. Diz aos outros: "Não, não quero ver televisão!". Levanta a voz, senão não te ouvem: "Estou a ler! Não quero que me incomodem!". Não devem ter-te ouvido, com aquele barulho todo; fala mais alto, grita:”Estou a começar a ler o novo romance de Italo Calvino!"
Alguns livros marcam minha vida, entram na lista de re-leituras. Assim é 'Se um viajante numa noite de inverno' de Italo Calvino.
Livro cujo personagem central é o próprio objeto-livro. Que divide a tarefa da escrivinhação com o leitor, ao se colocar na pele de quem o está lendo. Que sugere posições para ser lido, que brinca com o próprio ato de ler (e escrever) e que depois mergulha num labirinto, num quebra-cabeças de estilos e estórias, onde um livro leva a outro e a outro... que nunca é concluído...
Genial, ousado, surpreendente, desafiante, profético e atualíssimo (foi escrito em '79).
Perfeito para quem saboreia e ama esse objeto feito de papel, tinta e palavras.
Perfeito para quem gosta dos bastidores da criação da literatura e, claro, para quem não se importa em ficar sem saber o final da história...
Tradução de Margarida Salomão, Nova Fronteira, 1982
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